sexta-feira, 22 de maio de 2009

Poema original de Peter Hadke:

Als das Kind Kind war,
ging es mit hängenden Armen,
wollte der Bach sei ein Fluß,
der Fluß sei ein Strom,
und diese Pfütze das Meer.
Als das Kind Kind war,
wußte es nicht, daß es Kind war,
alles war ihm beseelt,
und alle Seelen waren eins.
Als das Kind Kind war,
hatte es von nichts eine Meinung,
hatte keine Gewohnheit,
saß oft im Schneidersitz,
lief aus dem Stand,
hatte einen Wirbel im Haar
und machte kein Gesicht beim fotografieren.
Als das Kind Kind war,
war es die Zeit der folgenden Fragen:
Warum bin ich ich und warum nicht du?
Warum bin ich hier und warum nicht dort?
Wann begann die Zeit und wo endet der Raum?
Ist das Leben unter der Sonne nicht bloß ein Traum?
Ist was ich sehe und höre und rieche
nicht bloß der Schein einer Welt vor der Welt?
Gibt es tatsächlich das Böse und Leute,
die wirklich die Bösen sind?
Wie kann es sein, daß ich, der ich bin,
bevor ich wurde, nicht war,
und daß einmal ich, der ich bin,
nicht mehr der ich bin, sein werde?
Als das Kind Kind war,
würgte es am Spinat, an den Erbsen, am Milchreis,
und am gedünsteten Blumenkohl.
und ißt jetzt das alles und nicht nur zur Not.
Als das Kind Kind war,
erwachte es einmal in einem fremden Bett
und jetzt immer wieder,
erschienen ihm viele Menschen schön
und jetzt nur noch im Glücksfall,
stellte es sich klar ein Paradies vor
und kann es jetzt höchstens ahnen,
konnte es sich Nichts nicht denken
und schaudert heute davor.
Als das Kind Kind war,
spielte es mit Begeisterung
und jetzt, so ganz bei der Sache wie damals, nur noch,
wenn diese Sache seine Arbeit ist.
Als das Kind Kind war,
genügten ihm als Nahrung Apfel, Brot,
und so ist es immer noch.
Als das Kind Kind war,
fielen ihm die Beeren wie nur Beeren in die Hand
und jetzt immer noch,
machten ihm die frischen Walnüsse eine rauhe Zunge
und jetzt immer noch,
hatte es auf jedem Berg
die Sehnsucht nach dem immer höheren Berg,
und in jeder Stadt
die Sehnsucht nach der noch größeren Stadt,
und das ist immer noch so,
griff im Wipfel eines Baums nach dem Kirschen in einemHochgefühl
wie auch heute noch,
eine Scheu vor jedem Fremden
und hat sie immer noch,
wartete es auf den ersten Schnee,
und wartet so immer noch.
Als das Kind Kind war,
warf es einen Stock als Lanze gegen den Baum,
und sie zittert da heute noch.






!

Queres brincar comigo à rodinha? Anda lá! Temos a tarde inteira, um tempo infinito! Lembras-te? Quando acordávamos e tínhamos a eternidade de UM DIA inteirinho para brincar? Como anulamos agora os tempos rectilíneos de permeio é que não sei. Sei muito pouco hoje em dia nos meus dias curtos e inexpressivos de contas forçadas.
Carla Araújo

Segue-se uma versão inglesa do poema de Peter Handke, Das Lied vom Kindsein, que não deve dispensar a audição do poema original disponível no Youtube:


Song of Childhood
( By Peter Handke )
When the child was a child,
it walked with his arms swinging.
It wanted the stream to be a river,
the river a torrent,
and this puddle to be a sea.
When the child was a child,
it didn't know it was a child.
Everything was full of life,
and all life was one.

When the child was a child,
it had no opinions about anything.
It had no habits.
It sat cross-legged,
took off running,
had a cowlick in his hair,
and didn't make a picture when photographed.

When the child was a child,
it was the time of these questions:
Why am I me, and why not you?
Why am I here, and why not there?
When did time begin and where does space ends?
Isn't life under the sun just a dream? Isn't what I see,
hear and smell only the illusion of a world before the world?
Does evil actually exist?
And are there people who are really evil?
How can it be that I, who am I,
didn't exist before I came to be?
And that someday the one who I am will no longer be the me I am?

When the child was a child,
apples and bread were enough for it,
and it is still that way.
When the child was a child,
berries fell into its hands as only berries do,
and they still do.
Fresh walnuts made its tongue raw,
and they still do now.
On every mountain top,
it had a longing for a yet higher mountain,
and in every city it had a longing for a yet bigger city.
And it is still that way.
It reached for cherries in the treetop with the elation it still feels today.
It was shy with all strangers,
and it still is.
It awaited the first snow,
and it is still this way.

When the child was a child,
it threw a stick into a tree like a lance.
And it still quivers there today.







Das Lied vom Kindsein

Como se ouve um poema? As fronteiras das palavras esbatem-se e cedem espaço à cadência, ao tom, à harmonia... Foi assim que cedo me deliciei com as línguas estrangeiras e que, sem as entender ainda, tratava de inventar idiomas com as amigas. Quando se ouve um poema na língua materna, também se faz essa regressão a uma infância perdida mas pode ouvir-se a língua mãe com o espanto com que ouvimos um idioma estrangeiro? Um amigo meu, alemão, prometeu "cantar-me" este poema como se o lesse aos seus filhos. Eu, que em alemão sou ainda mais nova do que os seus rapazes, fico embevecida com a sua oferta e cantarolo: «warum bin ich, warum nicht du?/warum bin ich hier, warum nicht dort?» (tradução livre: «Por que sou eu e não tu, por que estou eu aqui e não acolá?»).

Mas nem todo o poema se assemelha a uma cantilena infantil (cantilenas essas que me lembram o terraço em casa da minha "mestra", assim chamada a senhora que nos iniciava na escrita, na leitura e nas contas antes do tempo, no tempo em que não havia tempo..., no tempo em que contar era tão apetecível na folha aos quadrados como a jogar à macaca... lembro-me nitidamente do verde quase alface dos rebordos desse terraço...). Mas, concluía eu, ser que pensa e pondera, que nem todo o poema se apresenta nesse registo de transposição de tempos sem tempo, nesse círculo feliz e luminoso. Trechos de dureza, de infeliz resignação ao pensamento formado e reflexivo, de tempos fechados e rectilíneos, se interpõem... ainda que quem cante, cante com teimosia que ainda assim é o mundo, como quando éramos crianças. O mundo é afinal o mesmo, mas nós perdemo-lo ou passámos ao seu lado. Afinal, talvez que, à caverna de sombras em que vivemos, anteceda o mundo que a criança que fomos um dia habitou.
Carla Araújo
O meu barco já não dança
Ata-lhe uma corda a florir inteira
Só cabo viril entrançado afiança
Levar ao mar barco ou traineira

Mas meu barco detém as cores
do amor que jaz a seus pés
Carmesim paixão e azul das dores
corta-lhe o perfil de lés a lés

Molha-o uma água fria e diáfana
Tempera-lhe a fronte ao de leve
Solta-se-lhe a corda liana
a lembrar-lhe o amor breve

A terra não é o seu destino
Nem do alto mar conhece aventura
Queda-se certo mas sem desatino
Enquanto o sol lhe sabe a ternura

A corda abre-se num choro salgado
que a areia fina não detém
Sabe-se atada ao seu amado
Por amor dele se faz refém

Maria Torreira